Em agosto, comemoraram-se os 10 anos da Lei 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção Empresarial. Inicialmente, cabe considerar que essa Lei traduz um importante avanço na complementação de um sistema normativo de definição de medidas e instrumentos necessários a viabilizar o alcance de uma maior efetividade no enfrentamento e na resposta estatal aos desvios decorrentes das práticas ilícitas na relação entre a esfera pública e a privada.

Nestes 10 anos de sua edição – a considerar que a vigência deu-se somente em 28/01/14 - , a Lei Anticorrupção já produziu alguns importantes resultados na responsabilização administrativa e civil das pessoas jurídicas por atos lesivos praticados contra a Administração, cabendo reconhecer sua destacada aplicação no âmbito federal, uma discreta observância no âmbito estadual e uma quase imperceptível utilização de alcance municipal.

A Lei 12.846/13 revela grande mérito pela responsabilização direta que direciona às pessoas jurídicas, em suas relações ilícitas com o setor público. Até sua vigência, e salvo nos casos de ilícitos em licitações e contratos com a Administração Pública, ou por ilícitos capitulados como de improbidade administrativa, em ambos com suas severas sanções, as pessoas jurídicas se encontravam alheias às consequências de suas práticas desviantes ou, quando muito, as suportavam de modo bastante discreto e desproporcional aos benefícios obtidos.

Aproveitando-se de institutos sancionadores de outras leis, assim como de instrumentos de prevenção, apuração, responsabilização e solução para os ilícitos praticados pelas empresas e também já previstos em nosso ordenamento jurídico, como o Acordo de Leniência (Lei 12.529/11 – Lei do CADE), e as Políticas de Controle Interno e Integridade (Lei 9.613/98 – Lei dos Crimes de “Lavagem de Dinheiro”, com as alterações introduzidas pela Lei 12.683/12), a Lei 12.846/13 acabou dando-lhes nova roupagem, adaptando-os às especificidades que objetivava alcançar.

Mas também houve novidade na Lei 12.846, como a sanção civil de "dissolução compulsória da pessoa jurídica", imposta exclusivamente em juízo, prevista em seu artigo 19, III. Trata-se de medida extrema que, atualmente, não encontra semelhança no Direito brasileiro, podendo-se ter alguma discreta comparação dessa providência com a previsão do artigo 21, III, do revogado Código Civil de 1916, e que trata do término da existência da pessoas jurídica quando incorra em atos opostos aos seus fins ou por atos nocivos ao bem público, podendo também aquele instituto ter alguma sutil aproximação com a liquidação extrajudicial das instituições financeiras, quando gravemente violadas as normas legais e estatutárias que disciplinam a atividade da instituição, na forma do artigo 15, I, "b", da Lei 6024/74, em ambas hipóteses, porém, realizadas extrajudicialmente.

Dentre outras virtudes, talvez a mais destacada tenha sido o novo paradigma de conscientização inaugurado pela Lei 12.846/13, no sentido de despertar o empresariado brasileiro com atuação no país e no exterior, ou o empresariado multinacional que aqui atua, a observar lisura e comprometimento de integridade em suas relações negociais com o Estado, em um ambiente com a necessidade de práticas empresariais escoradas na cultura da honestidade.

Assim, não se pode deixar de reconhecer a importante mudança de mentalidade que emerge da Lei 12.846/13 e pelo recado que evidencia: de se exigir honestidade das empresas sob o grande risco de, não se inclinando a esse valor, ser também muito grande o risco de suportarem elevadas sanções por seus desvios. Da nova feição inaugurada pela Lei 12.846 no plano das responsabilidades, os ilícitos passam a ser focados não mais e apenas no CPF, mas, também, com mesmo ou maior vigor no CNPJ.

Desafios e perspectivas para os próximos anos

Um importante desafio nesse novo modelo de responsabilização empresarial é exatamente o de se alcançar eficiência na prevenção da prática de atos a evitarem ocorrências passíveis de configurarem a capitulação dos ilícitos definidos pela Lei Anticorrupção.

A tal ponto, a importância deste comportamento efetivo das empresas quanto a gestão de riscos e a padrões de integridade que própria lei assegurou que a adoção de programas internos com aquele objetivo seria considerada como avaliação favorável à empresa na definição de sanções impostas por ilícitos praticados.

E, passados 10 anos da edição da lei, realmente tem-se notado o esforço das empresas em adotarem mecanismos de controle, apesar de, por outro lado, ser de perceptível constatação que muitas de tais providências não têm sido suficientes aos fins pretendidos. Ou seja, nota-se que essas providências não têm observado a eficiência mínima a se poder afirmar que a empresa de fato se encontre acobertada por um sistema no que tange a estrutura e ações de prevenção, acautelamento e evitação de práticas irregulares.

A indevida ou imprópria adoção de um sistema de controle robusto e consistente à prevenção de irregularidades no plano da responsabilização civil e administrativa das pessoas jurídicas e mesmo da capacidade em se oferecer uma resposta adequada às correções necessárias têm resultado na constatação de que muito do que as empresas fazem não passam de mecanismos de integridade meramente aparentes, e desprovidos de elementos estruturais e operacionais a identificá-los como realmente efetivos, como objetivado pelo legislador.

Não raro, a causa dessa fragilidade na eficiência esperada decorre da falta de interação das empresas com profissionais realmente habilitados em oferecer alternativas e soluções para um ambiente de integridade empresarial.

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Alexandre Vidigal

Sócio
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